Coordenação: Marcella Pereira de Oliveira
Horário: Quintas-feiras, quinzenal, das 8h30 às 10h.
Datas: 7/3, 21/3, 11/4, 25/4, 9/5, 23/5, 6/6, 20/6, 8/8, 22/8; 5/9, 19/9; 10/10, 24/10; 7/11, 21/11
Local: Clin-a em São José dos Campos, ou on-line.
Inscrição: núcleo.psicanalise.arte@gmail.com
Objetivo: Investigar a interface entre psicanálise e arte, tomando os conceitos de sublimação e sinthoma como significantes norteadores.
O núcleo tem por proposta investigar a intersecção entre psicanálise e arte. Considerando que ambas são formas de trabalho que partem da linguagem, a segunda pode auxiliar a primeira dentro da perspectiva mais elementar desta; que é a cura pela fala. A arte existe muito anteriormente à existência da psicanálise, como formas de expressão aos efeitos da cultura sobre o corpo, o que também pode ser pensado como o caminhar da linguagem ao longo dos tempos. Lacan, com sua formulação de que “um significante é o que representa um sujeito para um outro significante”, captura a palavra em sua materialidade, ou pensando em termos de arte, plasticidade, o que torna possível uma dimensão temporal tomada a partir do caminhar da palavra e da fala.
O sintoma enquanto acontecimento de corpo, pensado por Lacan[1] em seu segundo ensino, ressalta o encontro, sempre traumático, da palavra com o corpo enquanto uma marca de gozo. Este destaque comprova que, desde antes da palavra ser usada enquanto comunicação, ela provoca satisfação, produz marcas no corpo, em qualquer estrutura. Desta forma, o homem é efeito do significante, o qual nunca se decifra de todo, submetendo-o a sua falta-a-ser.
Com ajuda de Mário Pedrosa[2], podemos entender a arte em seu poder transformador, o qual pode estar presente em qualquer civilização, como mostra Lacan[3], descrevendo as pinturas em cavernas, realizadas por povos primitivos. Temos aí primeiros rudimentos do poder simbólico do humano, o qual materializa sua vida através de uma escritura, cujo ato instaura verdades e cria ficções, saberes com os quais o sujeito se identifica. O ser vivo é duplicado pela vida significante, como destaca Miller[4], diferenciando-o do animal.
Para a aproximação da psicanálise com a arte, o núcleo toma como base o conceito de sublimação. Já nas cartas a Fliess, Freud[5] se refere à sublimação, neste primeiro momento, associando-a à fantasia: “As fantasias provêm de coisas que foram ouvidas, mas só posteriormente entendidas, e todo o material delas, é claro, é verdadeiro. São estruturas protetoras, sublimações dos fatos, embelezamentos deles e, ao mesmo tempo, servem para o alívio pessoal”. A sublimação aqui é alinhada à importância da criação de ficções; o que pode ser compreendido como o sujeito tomando a palavra a partir da própria interpretação, assumindo-a para si, relendo-a. De forma semelhante, pode ser compreendida a arte, como a habilidade de dizer de si mesmo uma mentira; mais real do que a própria realidade.
Lacan[6], com ajuda da arte, explora o conceito de sublimação no seminário 7, como elevação do objeto – de relação, da pulsão – à dignidade da Coisa. Sublimar as pulsões pode ser entendido como uma forma de elevar o significante às coordenadas de prazer deixadas pela Coisa; coordenadas estas que podem ser materialmente lidas por outros significantes, os quais, ao nomearem os objetos da pulsão, atribuem-lhes um ser.
A morte da Coisa, ou seja, o distanciamento entre a palavra e a Coisa, abre para a sobrevida significante, a qual tem efeitos sobre o tempo; o que a arte mostra com os movimentos artísticos que andam conforme suas épocas. Por exemplo, Cezanne[7], na obra “Maças e laranjas” transmite a simbolização da natureza morta – ou morte da Coisa – pintada e enquadrada sob uma tela; uma subjetivação da ação da cultura sobre a natureza. O século XIX, seu século de vida, foi período de intensas inovações culturais, o que parece ser materializado nas obras de Cézanne, em sua forma de subjetivar os efeitos do Outro
A poesia, umas das formas de arte trabalhada no núcleo, pode ser lida como uma linguagem, cujo ponto de corte localiza a cicatriz do traumático, ou de um acontecimento de corpo, transmitido pelo Outro. Ela também pode ser vista como uma forma de uso da linguagem, que destaca sua múltipla possibilidade de significação. Para pensar a interpretação enquanto técnica que se utiliza principalmente da escansão e da pontuação, a poesia é fundamental. Tal como a escrita nas cavernas, ela instaura meias verdades, e materializa conteúdo inconsciente.
No seminário 23, analisando a obra de Joyce, Lacan a coloca como uma espécie de envelope para a verdade do sintoma, a qual seria contida e modelada, não levando ao pior. Joyce faz de sua obra de arte o seu escabelo, que o insere na cultura. O escabelo é visto com Miller[8] como aquilo sobre o qual o falasser se ergue, eleva a si mesmo como belo, ao invés de elevar o objeto, como na sublimação. O escabelo pode ser visto como sendo a sublimação, mas funda-se sobre o rechaço do inconsciente “estruturado como uma linguagem”; ou ainda, rechaço do Outro. A análise lacaniana da obra de Joyce revela uma conjugação singular entre o escabelo e o sinthoma, na medida em que ele fez sua arte com o gozo opaco do seu sintoma. O que vai de encontro com a conclusão de Miller, no mesmo texto, de que o objetivo da análise, no século atual, opera a partir da castração do próprio escabelo – e não a do complexo de Édipo –; o que pode trazer à tona o gozo opaco do sinthoma.
Forma de trabalho: Uma pesquisa comum ao núcleo, conduzida pela coordenação por leituras com apresentações de textos, e eventuais produções escritas. Pesquisas singulares dos integrantes do núcleo, as quais também são apresentadas, de acordo com a manifestação voluntária dos integrantes. O núcleo também conta com apoio de material artístico, como filmes, poemas, obras visuais; e com os próprios artistas. Todos os membros do grupo devem participar da pesquisa, ficando a encargo da coordenadora a organização das apresentações e produções, bem como provocar o trabalho.